"O Quinze", de Rachel de Queiroz
Reli o livro "O Quinze", de Rachel de Queiroz, que tinha apenas 20 anos quando o concebeu. É sobre a seca de 1915, uma daquelas secas cíclicas nordestinas que passam deixando um rastro de destruição e fome...
Quando o Regionalismo nasceu no Romantismo, ele tinha um caráter ufanista – é que a gente tinha se livrado da "mala sem alça" que era o Processo Colonial e tudo era muito cor-de-rosa, a gente não tinha mais nada que atrapalhasse o que parecia ser um futuro brilhante para o país. As descrições alencarianas tendiam ao ideal, e tudo, na natureza nordestina, era belo e bom. A natureza nordestina presente em "O sertanejo" era tão acolhedora e bela quanto a gaúcha de "O gaúcho"; não havia problemas; a natureza, ao contrário, era a solução.
Aí veio o Regionalismo Realista ou, mais precisamente, Naturalista: o sertão ganha cores de ambiente determinador e destruidor e, então, não havia, para o personagem, nenhuma redenção possível, pois ele era totalmente vencido pela circunstância ambiental implacável.
Segue-se o nosso grande divisor de águas, Euclides da Cunha, que, olhando uma realidade brasileira – a Guerra de Canudos –, ultrapassou o determinismo europeu e inaugurou um jeito de ver o Brasil, independente da Europa.
O Regionalismo Nordestino de 30 é herdeiro dessa perspectiva, ou seja, olhando realidades nossas (a seca, a estrutura fundiária injusta, o patriarcalismo, a pobreza, as reações, a falta de horizontes, as relações sociais, familiares, os costumes, o atavismo religioso, as linguagens desviantes, o estudo das expectativas...), o autor se impõe o papel de denunciar o problema, avaliar causas e efeitos, descrever circunstâncias, analisar diferenças e semelhanças, comparar, explicar as especificidades nordestinas ao resto do Brasil, que precisava entender o porquê de aqui ter sido tão sangrenta a Revolução de 30. É que as raízes do "Ancien Regime" (usando uma expressão francesa), aqui no Nordeste, eram muito fundas e, quando o poder saiu das mãos dos proprietários, revolveu muita terra.
Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Jorge Amado e Érico Veríssimo – cada qual com suas circuntâncias, estilos e visões de mundo, é claro – retrataram sua região, seu estado, sua estrutura fundiária e respectiva produção agrícola (cana, cacau, carne...). Mas se mantinha o olhar de defesa dessa população, inaugurado no Pré-modernismo de Euclides da Cunha, Monteiro Lobato e Lima Barreto.
Assim, o sertanejo de Euclides, ou mesmo o Jeca Tatu de Lobato reaparecem em Chico Bento, um dos personagens centrais de "O Quinze", de Rachel. É que o livro tem dois núcleos paralelos e que se interligam – o de Chico Bento e sua família (sua esposa Cordulina e seus 5 filhos que a seca reduziu a 2), de classe dominada, e sua marcha de retirada da seca, totalmente destruídos; e o de Vicente e suas irmãs, Conceição e sua avó, Inácia, de classe dominante, também afetados pela seca, embora de forma menos intensa.
Em Rachel, muito mais do que a estrutura fundiária, é a seca a personagem central, é ela que quebra o equilíbrio mínimo de sobrevivência que os outros personagens têm, é ela o elemento desarticulador e desagregador, que detona o texto como resposta necessária do autor. Ou missão. Ou ato de responsabilidade possível.
É um livro triste, pois não há luz no fim do túnel da seca, vista como um atavismo inescapável, cíclico, degradador. As mudanças não trazem felicidade, só conformação, aceitação do inevitável, irrealização do amor, embate inútil entre o homem e a natureza titânica, invencível na sua brutalidade e na sua perseguição.
O que me admira é uma moça de apenas 20 anos pensar assim...
Aí veio o Regionalismo Realista ou, mais precisamente, Naturalista: o sertão ganha cores de ambiente determinador e destruidor e, então, não havia, para o personagem, nenhuma redenção possível, pois ele era totalmente vencido pela circunstância ambiental implacável.
Segue-se o nosso grande divisor de águas, Euclides da Cunha, que, olhando uma realidade brasileira – a Guerra de Canudos –, ultrapassou o determinismo europeu e inaugurou um jeito de ver o Brasil, independente da Europa.
O Regionalismo Nordestino de 30 é herdeiro dessa perspectiva, ou seja, olhando realidades nossas (a seca, a estrutura fundiária injusta, o patriarcalismo, a pobreza, as reações, a falta de horizontes, as relações sociais, familiares, os costumes, o atavismo religioso, as linguagens desviantes, o estudo das expectativas...), o autor se impõe o papel de denunciar o problema, avaliar causas e efeitos, descrever circunstâncias, analisar diferenças e semelhanças, comparar, explicar as especificidades nordestinas ao resto do Brasil, que precisava entender o porquê de aqui ter sido tão sangrenta a Revolução de 30. É que as raízes do "Ancien Regime" (usando uma expressão francesa), aqui no Nordeste, eram muito fundas e, quando o poder saiu das mãos dos proprietários, revolveu muita terra.
Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Jorge Amado e Érico Veríssimo – cada qual com suas circuntâncias, estilos e visões de mundo, é claro – retrataram sua região, seu estado, sua estrutura fundiária e respectiva produção agrícola (cana, cacau, carne...). Mas se mantinha o olhar de defesa dessa população, inaugurado no Pré-modernismo de Euclides da Cunha, Monteiro Lobato e Lima Barreto.
Assim, o sertanejo de Euclides, ou mesmo o Jeca Tatu de Lobato reaparecem em Chico Bento, um dos personagens centrais de "O Quinze", de Rachel. É que o livro tem dois núcleos paralelos e que se interligam – o de Chico Bento e sua família (sua esposa Cordulina e seus 5 filhos que a seca reduziu a 2), de classe dominada, e sua marcha de retirada da seca, totalmente destruídos; e o de Vicente e suas irmãs, Conceição e sua avó, Inácia, de classe dominante, também afetados pela seca, embora de forma menos intensa.
Em Rachel, muito mais do que a estrutura fundiária, é a seca a personagem central, é ela que quebra o equilíbrio mínimo de sobrevivência que os outros personagens têm, é ela o elemento desarticulador e desagregador, que detona o texto como resposta necessária do autor. Ou missão. Ou ato de responsabilidade possível.
É um livro triste, pois não há luz no fim do túnel da seca, vista como um atavismo inescapável, cíclico, degradador. As mudanças não trazem felicidade, só conformação, aceitação do inevitável, irrealização do amor, embate inútil entre o homem e a natureza titânica, invencível na sua brutalidade e na sua perseguição.
O que me admira é uma moça de apenas 20 anos pensar assim...